segunda-feira, junho 29, 2009

Fala, Drummond

Há vezes em que postar aqui me toma um certo tempo. Nunca fui muito inspirada, mas escrever se tornou um ato necessário. E apesar de que há textos por aí escondidos em algum caderno, estes não seriam dignos de postagem por serem ruins ou por tratarem de coisas que só eu entenda e onde não fui competente o suficiente para me fazer entender.
Tentando manter as atividades blogueiras, virei a noite pensando no que escrever. Hora vai, hora vem e nada. E não sei porque cargas d'água me veio a mente esse poema do grande Drummond.
P.S.: Ao contrário do que alguns podem pensar, não tem nenhum vínculo a sentimento amoroso. hauahauahua
Amar
Que pode uma criatura senão,
senão entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar
,amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
Carlos Drummond de Andrade

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